quinta-feira, 7 de julho de 2011

Restaurante Terreiro do Paço - Lisboa - Outras cartas de amor

Nélson Jerónimo Rodrigues
   
O que durante anos foi o posto central dos correios de Lisboa passou a acolher um restaurante que faz jus à nobreza da sua localização. Cartas, agora, só as gastronómicas, mas estas também falam de amor. Pelos sabores e memórias do nosso Portugal.
   
A história deste espaço não se resume aos tempos em que ainda se escreviam cartas de amor. Muito antes de pertencer aos CTT, esta jóia da arquitectura pombalina já tinha albergado parte do arsenal da Marinha e os seus terrenos pertencido ao antigo Paço Real, que deu nome a um dos mais belos “terreiros” da Europa.

Os tempos modernos quiseram devolver a Praça do Comércio (como também é conhecida) aos lisboetas, mas entre avanços e recuos houve várias falsas partidas. Uma delas foi precisamente o Restaurante Terreiro do Paço que, numa primeira fase, não resistiu às intermináveis obras daquelas paragens.

Hoje, já lá não mora o conhecido chefe Vítor Sobral, mas o grupo Lágrimas não ficou a chorar sobre o leite derramado e voltou a abrir esta emblemática casa. Desta vez privilegia-se sobretudo a chamada “comida de bem-estar”, mais descontraída e informal, mas sempre atenta ao detalhe.
   
Mão cheia de ambientes
Enquanto sala de estar de Lisboa, a Praça do Comércio é uma autêntica passadeira de culturas, hábitos e modos de estar distintos, por isso o renovado Restaurante Terreiro do Paço teve de adaptar-se a essa realidade. O resultado está à vista de todos desde Fevereiro de 2011.

Dentro e fora de portas foram criados vários espaços distintos, que vão da “tasca gourmet” a uma mezzanine mais selecta e requintada. Além das duas esplanadas, uma em plena praça e a outra virada para o Páteo da Galé (espaço interior), há mais três salas com personalidades e cartas próprias.

Logo à entrada do restaurante fica um espaço intermédio, onde podemos comer uma refeição ligeira e tomar um copo até bem tarde. As mesas, mas também alguns petiscos, fazem lembrar o melhor de uma tasca à portuguesa, enquanto as paredes estão carregadas de simbolismo histórico.
   
É nelas que encontramos algumas das mais célebres frases pronunciadas na Praça do Comércio, como o grito de “infames, infames!” lançado por D. Amélia após o regicídio ou o “É só fumaça, o povo é sereno”, que o então Primeiro-Ministro Pinheiro de Azevedo deixou escapar num dos momentos mais quentes do pós-25 de Abril.

Desta sala passamos para a área principal do restaurante, onde um enorme mapa-mundo - “desenhado” com postais turísticos - salta imediatamente à vista.

O mobiliário também não esconde as influências vintage, mas o que mais surpreende a maioria dos clientes são as toalhas de plástico e os copos antigos (sempre diferentes) que parecem saídos da série “Conta-me como foi”.

Mais contemporâneos são os sons ao vivo que enchem este espaço em vários dias da semana, seja nas "Happy Wednesdays" de quarta-feira (com dj`s e karaoke) ou nos "Paço Música Sunsets", com artistas de vários quadrantes a animarem os finais de tarde de sexta e e sábado.  
   
Aqui podemos optar por um buffet de almoço (também ao sábado) a preços acessíveis (11 €; sem bebidas), o que já não é fácil de encontrar em muitas casas lisboetas com os mesmos níveis de apresentação e serviço.

E quem ficar junto a uma das grandes janelas ganha também uma vista privilegiada, com a Sé de Lisboa ou o Castelo de São Jorge a acompanharem a refeição.

Ainda nesta sala, mas num andar superior fica a área mais formal e sofisticada do Terreiro do Paço. Nesta mezzanine primam as toalhas brancas, a luz reduzida e, claro, o serviço à carta.
   
A união faz… a ementa
É fácil ter saudades da gastronomia de Vítor Sobral, por isso encontrar um sucessor para a cozinha do Terreiro do Paço mostrava-se uma tarefa quase hercúlea, para não dizer impossível. Então, como substituir um grande chefe na criação dos pratos? Só com vários grandes chefes!

A solução encontrada foi, de facto, engenhosa e criativa, mas parece ter resultado. Na prática, a ementa passou a ter a assinatura de todos os chefes do grupo Lágrimas, como Albano Lourenço (Restaurante Arcadas da Capela), Luís Casinhas (Cantina da Estrela), Miguel Oliveira (restaurantes do Casino Lisboa) e até o famoso Joachim Koeper, do Eleven.

Não conte encontrá-los sempre lá (e muito menos todos juntos), mas o melhor de cada um está bem expresso na carta que elaboraram em conjunto.
   
Os raviolis negros de bacalhau com broa (foto ao lado), o risotto balsâmico de cogumelos e foie ou a perna de borrego com polenta são apenas alguns dos pratos que deixam água na boca de qualquer um, mas há mais para nos deleitarmos.

Logo para entrada, não deixe de provar as pissaladiéres, uma tarte de massa folhada (original do sul de França), enquanto nas sobremesas é difícil ficar indiferente ao pomposo nome de “O melhor pão-de-ló do Universo”.

A carta de vinhos privilegia claramente os néctares produzidos em Portugal e está dividida (de forma divertida) consoante as suas características e regiões de proveniência. É por isso que lá encontramos, por exemplo, os “alentejanos de barba rija”, os “vinhos dos douro Boys” ou os “vinhos para sportinguistas e não só”…
   
As referências humorísticas estão, de resto, omnipresentes em todo o restaurante e não se limitam a este detalhe. Desde a decoração do espaço às próprias fardas (desenhadas pelo estilista Nuno Gama) há sempre um toque “português kitch” que nos faz sorrir.

Por exemplo, nas t-shirts dos empregados não podia faltar o nosso Galo de Barcelos, mas desta vez acompanhado com uma frase “para inglês ver” que também se pode aplicar à culinária: “Portuguese do it better”…

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